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Entenda como funciona a leitura no cérebro

Para as pessoas que gostam de tipografia, mas também se interessam pela forma com o cérebro processa a leitura dos textos, aí vai um resumo de 3 capítulos do livro “Compreendendo a leitura”, do Frank Smith. É leitura OBRIGATÓRIA para quem estuda tipografia a fundo. O texto foi resumido em 2008 pelo aluno Gabriel Jacobi, para a disciplina de Tipografia, na UFPR.

Capítulo 4: Entre os olhos e o cérebro

Nessa primeira parte, o autor discorre sobre os processos fisiológicos da percepção e como isso influencia na nossa forma de ler. A primeira distinção importante a ser feita é a dos elementos necessários para que a leitura ocorra: os visuais e os não-visuais. Os visuais são os aspectos “físicos” como uma iluminação apropriada, letras impressas (ou projetadas) e até mesmo os óculos. Já os aspectos não-visuais são aqueles que carregamos em nossa mente, como o domínio do idioma e o domínio do assunto abordado. Quanto mais informação não-visual possuímos, menos necessária é a informação visual. Por isso crianças e leitores inexperientes têm dificuldades com a leitura: seu repertório muitas vezes é limitado, tornando a compreensão lenta, ou até mesmo impossível. É preciso que haja uma combinação entre os elementos visuais e não-visuais para que ocorra uma interação entre o leitor e o texto.

Muitos de nós pensamos que a visão ocorre de uma forma automática: os olhos são literalmente janelas para o mundo. Na verdade a visão é uma ilusão que o cérebro produz, uma sensação de que estamos vendo. O que vemos na verdade não é a realidade e sim uma parte dela. Grande parte é “completada” por informações que já temos armazenadas no nosso cérebro. O que vemos também não fica muito tempo em nosso cérebro: ela permanece apenas por alguns milésimos de segundos num local chamado armazenamento sensorial. Se a troca de imagens ocorre de uma forma muito rápida, um fenômeno chamado mascaramento ocorre, onde a informação anterior é apagada pela posterior. Outra ilusão que temos é a que os nossos olhos sempre olham de forma fixa para os objetos. Involuntariamente nossos olhos estão sempre vibrando. Isso acontece para que diferentes células receptoras focalizem um mesmo objeto, reduzindo o esforço da retina. De fato, se anularmos esse efeito, toda a nossa percepção é prejudicada e o objeto começa a perder suas características diante de nós.

Porém o movimento do olho que realmente importa para a leitura é o que o autor chama de “movimento sacádico” Esse movimento é a forma como analisamos amostras ao nosso redor. Seja percorrendo as expressões de um rosto, seja percorrendo as linhas de um texto. Para a maioria dos ocidentais, esse movimento ocorre da esquerda para a direita e de cima para baixo. Quando fazemos uma pausa, chamamos esse momento de fixação. É durante a fixação que absorvemos as informações de um texto. Outro movimento que todos os leitores, experientes e inexperientes, fazem é o chamado de regressão: quando os olhos correm em direção contrária ao texto impresso. Tanto o número de fixações quanto o número de regressões pode diferenciar um leitor iniciante de um leitor mais fluente, este último precisa de um número bem mais reduzido desses movimentos. Porém, mesmo um leitor experiente pode ter dificuldades. Digamos que ele está lendo um texto de um idioma em que ele pouco domina: seu número de fixações e regressões será semelhante ao de um leitor notívago.

Todas essas explicações servem para mostrar que a visão deve ser rápida, seletiva e dependente da informação ao visual. Rápida porque, se demorarmos demais para processar uma informação, o discurso perde o sentido. Seletiva porque o cérebro não pode se sobrecarregar com muitas informações. Se isso acontecer, temos a chamada “Visão de Túnel”, como se o mundo fosse observado através de um canudo. E a única forma de tornar a leitura rápida e seletiva é através das informações não-visuais: o repertório que cada um tem e que permite ao leitor identificar rapidamente palavras e frases que lhe são familiares, retirando rapidamente significado do texto. Assim, podemos eliminar alternativas e o cérebro rapidamente faz as conexões necessárias para a compreensão.

Capítulo 9: A identificação do sentido

Quando lemos, pensamos estar processando letra por letra, até formar uma palavra. Depois, juntando palavra por palavra, formamos uma frase e extraímos o sentido dela. Na verdade isto está muito longe da realidade: quase todo esse processo é imediato. Talvez esse seja o ponto mais pertinente para a tipografia. Ela deve permitir que as letras (e o conjunto delas!) sejam identificadas quase que imediatamente a fim de que a extração do sentido também seja processada instantaneamente. A razão para isso é novamente o nosso repertório de informações não-visuais. Nesse caso, os nossos conhecimentos do idioma. No capítulo 4, o autor propunha a eliminação das alternativas. Isso poderia ser feito de duas formas: através do nosso conhecimento gramatical e através do contexto em que as palavras se encaixam. Por exemplo, se uma palavra começa com “h”, pelos nossos conhecimentos de português, sabemos que logo em seguida virá uma vogal e não uma consoante. O mesmo ocorre com o contexto: se temos uma frase que diz “Amanhã iremos ao c-“, as alternativas que completam essa sentença são relativamente pequenas, logo não levamos muito tempo tentando extrair o significado da frase. E mesmo que não saibamos o significado de uma determinada palavra, muitas vezes podemos deduzi-las de acordo com o seu contexto. Grande parte de nosso vocabulário é aprendido dessa maneira. Da mesma forma, o conhecimento prévio do que está para ser lido faz uma enorme diferença para a leitura. Isso ocorre porque as incertezas são diminuídas, então nos tornamos mais confiantes para seguir adiante.

Outro ponto importante é a forma como capturamos o sentido de uma palavra. Pensamos que é o conjunto de letras que nos dá o significado. Mais próximo disso e dizer que a imagem da palavra nos remete diretamente ao seu sentido. Quando lemos “mesa”, por exemplo, isso não se traduz para a definição de mesa e depois para a sua imagem. Ela ocorre de forma muito mais automática. Nesse sentido é interessante notar que é exatamente assim que funciona o alfabeto chinês ou japonês, onde cada símbolo gráfico carrega em si mesmo o sentido da palavra. Esse processo de identificação do sentido se perde se tentamos “subvocalizar” o que estamos lendo, ou seja, quando nós ouvimos a nós mesmos lendo. Ela retarda o processo de leitura e, conseqüentemente, o processo de compreensão.

Com esses conhecimentos, conseguimos entender porque muitas formas de ensino de leitura se tornam frustrantes. Em vez de se concentrarem no significado do discurso como um todo, os professores tem a tendência de se concentrar primeiro nas letras, depois nas palavras e finalmente nas frases. Da mesma forma, crianças se sentem pouco desafiadas com algo que elas ainda não estão habituadas. A leitura significativa é a melhor forma de expandir o vocabulário e proporciona uma base de conhecimentos sólida. Isso não pode ser obtido através da identificação de palavra por palavra.

Capítulo 10: Lendo, escrevendo e pensando

Nesse capítulo, o ator afunila seus assuntos e se concentra no próprio ato de leitura. Ele rejeita a idéia da leitura como uma idéia abstrata ou teórica e parte do pressuposto que a leitura deve estar ligada ao seu propósito. Dessa forma, a leitura não pode ser separada do próprio pensamento. Segundo essa lógica, o autor defende que a leitura, mais do que uma “transmissão de mensagem”, é compreensão. Sua definição é riquíssima e depende da finalidade do por que o leitor está lendo e o que ele está lendo. Não é apenas uma questão de identificar letras e palavras, mas sim de extrair seu sentido. Os sinais impressos no papel servem para responde questões que o próprio leitor formula. Logo, a leitura é a busca pela resposta dessas questões.

Para extrair o sentido do texto, o leitor vai se baseando em previsões (ou expectativas) em relação ao texto. Essas previsões são múltiplas e abrangem diversos níveis: algumas duram por toda a leitura enquanto outras são rapidamente descartadas. Digamos que o leitor esteja diante de um livro de mistério. Sua previsão global para o texto é a da solução do crime e ele irá percorrer todas as páginas esperando por ela . Porém dentro do texto, outras previsões vão surgindo: o clímax de alguma perseguição no meio da narrativa, por exemplo. Nesse caso, haveria uma previsão focal. Essas previsões se estendem pelos parágrafos e até mesmo pelas frases – ao terminar uma frase, logo queremos partir para a outra. São essas expectativas que o leitor tem que mantém o desenvolvimento da compreensão (pode ocorrer também de essas previsões simplesmente não se cumprirem). Essa mesma estrutura é adotada pelos escritores ao compor um texto. Digamos que o escritor queira explicar sobre o porque dos jilós terem um sabor desagradável. Essa será a sua intenção global. Para provar seu ponto de vista, ele irá passar por diversos argumentos, suas intenções focais e assim por diante. A maneira utilizada para que as expectativas e as intenções se cruzem é através das convenções: esquemas do gênero, a páginas, a estrutura do discurso, a coesão, a gramática e, por fim, a ortografia. Essa estrutura não deve ser considerada rígida: muitas vezes o escritor as quebra justamente para exceder as expectativas do leitor (José Saramago poderia escrever por páginas sem utilizar a pontuação, por exemplo).

O autor finaliza o capítulo explicando sobre as relações da leitura com o aprendizado e o pensamento. Para ele, o aprendizado é um processo sem fim e, “quanto mais lemos, mais somos capazes de ler”. Seja uma nova palavra ou uma nova idéia. Livros podem mudar nossa maneira de pensar. As experiências encontradas nos livros muitas vezes são tão vívidas quanto às da “vida real”. Nosso cérebro funciona à base de narrativas e até mesmo nossa percepção sobre um objeto em movimento é visto como uma “interação” em forma de narrativa. E não há atividade mais engajada em histórias do que a leitura.

Publicado por Ricardo Martins

Ricardo Martins é professor de tipografia, metodologia visual, projeto de embalagens e design avançado de identidade visual da Universidade Federal do Paraná. Além de professor na UFPR, atua como designer gráfico freelancer desde 1993. É diretor institucional da ProDesignPR (www.prodesignpr.com.br), membro do Type Directors Club de Nova Iorque (EUA), da Sociedade Brasileira de Design da Informação (SBDI) e do Communication Research Institute, em Melbourne (Australia).

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